Andanças

Nova Iorque

Não foi propriamente uma viagem de turismo puro e dura: estive em trabalho de segunda a sexta em Nova Iorque na sede da Reachdesk para uma série de reuniões com os meus colegas americanos e a direção da empresa.

Ainda assim, para o tempo que tinha disponível, consegui explorar bastante – acho que foi a primeira vez na vida em que o jet-lag me bateu de verdade, o que significa que pouco dormi; em vez de lutar contra isso, me deu para aproveitar e explorar, ou de noite ou de manhã bem cedo.

Realmente é uma cidade incrível – para o meu estilo, até demais, ou seja, adorei visitar, mas não me imaginaria algum dia morando por lá. É tudo em grande escala- tudo é imenso, tudo é intenso, parece que estamos andando em outra velocidade e o nível de informação e de coisas acontecendo à nossa volta é assustador.

Ao mesmo tempo, traz também uma esquisita sensação de familiaridade; “aterrei” no centro através da Grand Central Station e assim que cheguei à rua e vi as sarjetas fumegando, parecia realmente que estava dentro de um dos inúmeros filmes que assisti com NY como pano de fundo.

Logo que cheguei, fiz meio que um speed tour, começando por subir ao Top of the Rock, no Rockefeller Center (alô ex-coleguinhas da NBC!); optei por esse em vez do Empire State Building, achei que era uma experiência semelhante e preferi desfrutar de ver o bichão onde subiu o King Kong de frente, e não por dentro. De seguida, metro até ao memorial do World Trade Center (nenhuma razão de queixa do metro, que tem má fama mas funciona bem e não me senti menos seguro do que em algumas capitais europeias), e por fim peguei o ferry até Staten Island, só para passar por perto da Estátua da Liberdade. O ferry não pára na ilhota da senhora, mas é gratuito e uma viagemzinha tranquila e rápida para quem tem pouco tempo. Vi, saí do ferry e entrei de novo de volta.

Nessa noite, fui logo também a Times Square, que é pertinho do hotel onde fiquei. É obrigatório, impressiona, mas foi claramente o lugar que menos gostei de visitar – uma tremenda multidão a todo e qualquer momento, que está ali claramente só para picar a visita na checklist e tirar as malditas selfies, um bando de personagens “famosas” (Homem-aranha, Mickey, Minions, you name it) tentando impingir fotografias, uma coisa meio sufocante e sem caráter, para o meu gosto. Gostei do rolê aleatório que vi na foto acima – o Pantera Negra e o Chapolin discutindo em espanhol, com o Bumblebee agastado pelo mau ambiente que eles geravam.

Não dá para escapar muito de comer algum tipo de fast food durante uma viagem destas. Fora as cadeias mais comuns, comi no icónico Joe’s Pizza a tradicional e supostamente verdadeira pizza nova iorquina – boa, mas simplicíssima, nada de salientar, mas o que vou destacar e que mais me conquistou foram os bagels da Ess-a-bagel, que são incríveis para qualquer uma das refeições do dia. Me faltou experimentar várias coisas, talvez a principal os pastrami, que vão ficar para se um dia lá voltar.

Mais “fora” assim do que conhecia de memória, gostei de visitar o Chelsea Market, uma ilhota artificial lá em frente do mercado chamada mesmo de “Little Island”, e a biblioteca, a New York Public Library, que bem a calhar e condizer com o bucket hat que levei para proteger a careca, tinha uma exposição dedicada aos 50 anos do hip-hop.

Adorei andar e andar, e uma das coisas que mais gostei é a facilidade de deslocação a pé – além de ser tudo relativamente plano, o fato das ruas e avenidas serem números, faz com que seja muito fácil e intuitivo ir para qualquer lado – se quero ir para a 5ª avenida e estou na 2ª, é só seguir a ordem. Chinatown, Little Italy, o Central Park pela matina, atravessar a ponte de Brooklyn a pé, para quem como eu gosta de explorar a pé, é realmente incrível.

Nesse embalo, aproveitando que o voo de regresso era noturno, andei 27km nessa sexta-feira. Suado que nem um cavalo e com os pés rogando clemência, consegui tomar um banho no aeroporto (Minute Suites no Terminal 4, disponíveis com Revolut Premium) e faleci por dois dias.

I’ll be back.

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Cinemadas

Oppenheimer

Mais um filmaço do Chris Nolan. Ênfase no aço, em todos os sentidos.

Elencaço, com Cillian Murphy à cabeça, cada vez mais firme como um dos atores icónicos da sua geração e tempo. Sem necessidade de muitas falas ou espalhafatos, transparece sempre uma entrega tremenda e uma capacidade de se transformar nas personagens só com a postura. Mas todos os colegas, com maiores ou menores papéis, encaixam e brilham à sua volta, incluindo um Josh Hartnett tão “maduro” e que eu não via há tanto tempo que demorei a perceber quem era.

Banda sonorazaça, embalando de forma sublime a história, subtilmente dando o clima certo em cada momento; a maior parte do tempo, tenso ou melancólica, elevando a emoção nos momentos certos, seja imprimindo grandiosidade ou simplesmente se remetendo ao silêncio.

E que história, e que momentos. Não sei se para todos os gostos, dada a duração e a profundidade em certos “capítulos” menos dados à ação (exemplo – os “interrogatórios” da audição), mas é um prazer para quem consegue abstrair do tempo e simplesmente desfrutar.

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Andanças

Dubrovnik

Escolhemos Dubrovnik como o nosso destino de férias de Verão para 2023 meio que por acaso, e a partir de uma premissa simples: tínhamos já marcada uma viagem de dois dias à Eurodisney, e decidimos escolher um destino de praia com voos baratos e relativamente rápidos com partida de Paris. Porque não Dubrovnik?

Uma escolha acertada, mas vou tirar já do caminho a única parte negativa – o voo foi barato, sim senhor, mas é uma cidade bem no hype turístico, e consequentemente cara a todos os restantes níveis – alojamento, alimentação, etc. Nenhum absurdo, mas convém ir mentalizado que não dá propriamente para sobreviver muito no low-cost.

Estar no hype turístico não significou que tivemos que suportar multidões exageradas, pelo menos no período em que fomos (primeiras semanas de Julho); vi muitos comentários por aí de “sobre-população” e da necessidade de encarar filas para tudo, mas não foi, de todo, o caso: Lisboa está bem pior.

Nós não ficamos exatamente no centro – alojamo-nos em Lapad, uma pequena península a Oeste do centro histórico, diferente em geral da “cidade-mãe” por ser uma estância balnear mais recente/renovada e consequentemente com um aspeto mais moderno, mas deslumbrante com a sua enseada natural e o seu conjunto de pequenas praias (todas de pedra) para contemplar e refrescar do intenso calor do verão croata. Foi uma boa escolha, pela maior calma em relação ao centro, ficando a uns meros 15 minutos de lá, com um autocarro praticamente à porta do hotel, barato e com bom funcionamento e frequência.

O centro histórico por dentro das muralhas de pedra é realmente incrível, e nem é preciso grande planeamento ou indicação para explorá-lo – o ideal é vaguear pelas ruas e vielas e perdermo-nos e surpreender-nos por entre os diversos séculos de história que vão nos rodeando. Nem o constante bombardeamento com merchandising e ofertas relacionadas com o Game of Thrones (a série foi parcialmente filmada na cidade e contribuiu para o seu boom turístico) estragam a experiência.

Vale também a curta viagem de ferry à ilha de Lokrum onde, entre outras lendas e misticismos, o Rei Ricardo Coração de Leão se salvou de um naufrágio no regresso das cruzadas. Entre a beleza natural da ilha (incluindo um lago de água salgada – mas não tanto assim para o terem apelidado de “mar morto”), os inúmeros pavões que por lá vagueiam e as ruínas históricas do forte ou do lazareto, é realmente um dia ou uma tarde muito bem passada.

Comemos sempre muito bem – especial menção para um pequenito restaurante escondido numa das escadarias da cidade velha – Barba, o único lugar que repetimos, por unanimidade: tipo fast-food, mas em bom, e com uns anfitriões espetaculares.

Para rematar, o ponto alto da viagem foi um tour de barco (sim, nós somos obcecados com tours de barco) de meio-dia com partida do porto velho e exploração das grutas (Blue Cave, Green Cave, Three Caves – eles não são muito criativos a nomear grutas) das ilhas Elaphiti, incluindo também uma paragem na ilha de Lopud, para desfrutar da espetacular praia de Sunj, a única praia de areia da região, e vários mergulhos nas espetaculares águas do mar Adriático.

Sem sombra de dúvidas, uma viagem incrível e que merece ser recordada. Hvala, Dubrovnik.

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Sonoridades

Que tal um samba

Se tivesse que me apaixonar por um homem, seria por ele. Essa foi uma das muitas coisas que escrevi aqui ao longo dos anos sobre o grande mestre Chico, mas no meio de tantas obras que vi, ouvi e li, a verdade é que nunca tinha visto o homem ao vivo.

E do alto dos seus 78 anos, ele é uma divindade. Está impecável, firme, lúcido, e só isso já seria de valor constatar.

Não trazendo aqui um espectáculo exuberante, oferece um bom conjunto de músicas da sua imensa obra – tantas faltaram, e tantas sempre faltarão – cantadas e tocadas de forma crua, em cuja poesia é impossível deixar de me emocionar, tanto mais quanto me proporciona sentir comigo a companhia de quem já não está – meu pai – e de dar a conhecer na voz de outros um pouco de mim a quem estava a meu lado – minha filha.

Vale também pela Monica Salmaso, que o acompanha e que dá voz solo a vários clássicos neste show, com uma voz incrível, de beleza e de alcance que dá a impressão mesmo sem microfone chegaria ao Campo Pequeno inteiro.

Campo Pequeno esse que nunca é o melhor local a nível sonoro, mas que se transformou aquando da apoteose final com Tanto Mar, tanto mar. Cliché tremendo, mas impossível terminar sem: foi bonita a festa pá.

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Madalena – Um Ano

Estou há um ano sonhando que sou pai de três filhos maravilhosos.

Que a terceira encaixou como uma luva no meio da bagunça dos outros, e que quase já nasceu cheia de dentes e sorrindo.

Que tenho paz no meio do caos. Que nenhum é como o outro, e que se a única constante é a mudança, a variável que norteia é o amor.

Por favor não me acordem.

25 de Fevereiro de 2022. Que dia.

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Paternidade

Uma semana de Madalena

A 25 de Fevereiro de 2022, às 15h51, nasceu Madalena.

Desta vez, aconteceu no Hospital da Luz. Desta vez, o assento de nascimento leva o local de residência e não o do Hospital, que não fazia sentido que a minha filha fosse natural de Carnide, nas imediações do… Colombo. Margem sul, sempre.

Brincadeiras à parte, não é que não tenhamos sido bem tratados no Garcia da Orta em ambos os nascimentos anteriores, mas nos dias de hoje faz diferença ter um pouco mais de atenção e tranquilidade, que tivemos, sem mácula, no Hospital da Luz.

Tranquilidade é mesmo a palavra adequada, pois não só o parto foi o mais tranquilo e rápido dos três, como a Madalena tem sido uma bebé super pacífica nessa semana e uns dias de vida e de charme que já leva.

Ainda assim, confesso que ainda chorei mais, desta vez. É verdade que muita coisa fica mais fácil com a experiência. Mas não sei se pelo estado actual do mundo, pelo meu próprio estado, pela expectativa da convivência com os irmãos (que a veneram, ambos!), ou se por tudo isso e algo mais somado, o impacto e a emoção de trazer mais uma vida ao mundo, só aumentam.

Três sempre foi um número que esteve nas nossas cabeças. Até ver, é a última.

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Sonoridades

Bárbara Tinoco – Coliseu de Lisboa

Entre as várias questões que me afligem e em que sofro por antecipação desde que sou pai, sempre esteve no topo: e quando eles quiserem que eu os leve a concertos? E se fossem umas sofríveis boys band desta vida? Iria eu aguentar hora e meia de um David Carreira? Nada contra mas… nada a favor também!

Felizmente, a primeira experiência não só não foi de cortar os pulsos, como também foi surpreendentemente boa. A minha filha (8 anos à data) adora a Bárbara Tinoco, e ficou numa expectativa gigante no intervalo entre a compra dos bilhetes e o concerto em si, no fim de semana passado.

O pouco que conhecia era um refrão ou outro das mais cantadas na rádio (que já nem consumo muito, porque não ando diariamente de carro) ou pela Carol, pela casa afora, e não era propriamente fã, à primeira vista. Obviamente não fiquei tanto quanto a Carol, que sabe as letras de trás para a frente, mas a miúda tem verdadeiramente muito talento, quer como compositora quanto cantora, e com a pouca experiência que tem consegue dar uns concertos tocantes, intimistas, e sem grandes subterfúgios ou produções que não a honestidade da música.

Que a minha filha continue com bom gosto!

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Leituras

As velas ardem até ao fim

Este foi o livro que mais me marcou durante este ano, e obtive a recomendação para lê-lo de uma forma bastante inesperada; o meu antigo colega Paulo Pereira, que é professor no ISEL, costuma gravar o Bitaites, que não é mais que um conjunto de conversas descontraídas com antigos alumnus; neste episódio em particular, o convidado foi o meu amigo Diogo Machado, que foi ali apelidado de Professor Marcelo da informática após ter recomendado uma catrefa de livros no final. Curiosamente este não foi um deles, que veio como recomendação do próprio anfitrião, que em boa hora o fez.

O autor, que desconhecia até agora, é o húngaro Sándor Márai, que publicou esta obra pela primeira vez em 1942, retratando o encontro de um velho General com o seu melhor amigo, que recebe no seu castelo de caça para jantar após um hiato de 41 anos sem se verem, por motivos que se suspeitam, mas que nunca foram confirmados.

O livro deambula entre as memórias de infância, juventude e entrada na vida adulta de ambos, os derradeiros momentos que antecederam o desaparecimento do amigo, e o clima de tensão que envolve a longa espera, o reencontro e o jantar em si.

É-me difícil explicar a beleza e o encanto do livro, mas achei-o verdadeiramente incomparável com qualquer coisa que tenha lido; uma escrita simples, mas extremamente eficaz a transportar-nos para um ambiente de várias contradições: ora sombrio, ora exuberante, ora frio e extremamente analítico, ora a colocar o amor e a amizade (no fundo, o grande tema aqui dissertado) acima de tudo e de todos.

Muito bom.

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Cinemadas

Dune

Eu podia substituir a parte final da frase seguinte por N outras coisas que a pandemia deixou em suspenso, mas aqui vai: nunca imaginei que ia ficar exactamente dois anos sem ir ao cinema.

Na verdade, já tinha quebrado mais ou menos esse jejum com um filme ou outro em que fomos com as crianças, em horas mortas, mas não é a mesma coisa.

Confesso que neste fui mesmo pelo hype, pois não sou propriamente conhecedor do livro que lhe deu origem nem joguei por aí além o jogo na minha infância/adolescência, apesar das vagas memórias que tenho Dune II serem boas. Fora o falatório que o filme tem gerado, o realizador também me entusiasmou, pois a experiência visual do remake que ele fez do Blade Runner foi arrebatadora.

Esta não só não fica atrás como estica um pouco mais a corda; pode não fazer grande sentido comparar, mas se em grande parte do filme sente-se um pouco da mesma vibe intimista e introspectiva, há aqui uma dose muito maior de grandiloquência, e aquele sentimento quase constante que estamos a presenciar um acumular de tensão que vai desabar num final verdadeiramente épico, que… acaba por não acontecer, e deixa uma expectativa muito grande para a segunda parte, que já se confirmou que irá ser produzida, e que pela amostra (se é que se pode chamar isso a um filme de quase 3 horas) que aqui deram, promete, pois está todo um imaginário muito bem conseguido.

Para ser em grande, experimentei também pela primeira vez ver um filme numa sala IMAX, no Colombo; é sem dúvida um ecrã brutal e que dignifica um filme deste género, mas não tenho a certeza absoluta que justifique a deslocação (sim, ainda não há IMAX no “deserto” aka Margem Sul) e o preço. Fica pra pensar.

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Obrigado, Pai.

Não consigo imaginar a minha vida sem o meu pai… e não preciso.


Mesmo quando esteve distante, em Angola, no Congo, no Azerbeijão, na Rússia e em tantos outros lugares… ele esteve sempre presente, e não será diferente, de agora em diante.


Ele está sempre comigo e em mim. Na paixão por viajar, ler, aprender, conhecer verdadeiramente, sentir… no amor desmesurado pela família, e no quanto fazia questão de o relembrar diariamente… no prazer de ajudar, na resiliência, na paixão pelo Sporting… na capacidade de lutar, de resolver, de recomeçar e dar a volta ao texto (e tantas, mas tantas vezes o fez…)


Viveu pouco, mas viveu tanto, com uma intensidade tal e numa vida que se desdobrou em tantas, que dava vários livros, e quantas mais páginas houvessem mais ele surpreenderia.


Obrigado por tudo. Te amo, sempre, Pai.

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