Cinemadas

Once upon a time in Hollywood

Já não me lembro há quantos anos não ia ver um filme em noite de estreia, e nada melhor que um do Tarantino para desenferrujar essa experiência.

Segue firme a máxima de que não há um filme dele de que não tenha gostado; diria que, no meu top pessoal, este fica mais ou menos a meio, tendo coisas que adorei e não tendo outras das quais senti falta.

Adorei a atenção aos mais ínfimos pormenores no sentido de retratar fielmente a Hollywood do final dos anos 60; cenários, músicas (a banda-sonora é gigantesca), anúncios, carros… tenho para mim que este deve ter sido um dos filmes que mais prazer lhe deu filmar, sendo um verdadeiro playground para extravasar a sua paixão pelo cinema.

Senti falta dos longos diálogos filosóficos, dos quais houve apenas um cheirinho maior na efémera personagem do Al Pacino (brilhante no seu curto tempo de antena), e de uma pequena criatura de 10 anos chamada Julia Butters que é simplesmente genial.

Adorei a química entre o Brad Pitt e o Di Caprio, e a forma como o primeiro, sendo o “secundário”, roubou (deliberadamente?) a cena.

Senti falta de um daqueles cameos do Tarantino “só porque sim” (há um nos créditos, mas só em voz).

Senti falta das catarses de violência absurdas, mas adorei, mesmo, muito, a derradeira que acontece perto do final, do qual adoraria escrever muito mais, mas que estragaria tudo para quem ainda não viu.

Venha o próximo, supostamente o último.

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Glass

As expectativas para este filme estavam muito altas: Unbreakable está há vários anos no meu imaginário e a surpresa com que o seus protagonistas regressaram (acho que não vale a pena fazer spoiler alert quase 2 anos depois) tornou Split num dos meus filmes preferidos de 2017.

Não desiludiu. Começou tremendamente confuso, com transições muito estranhas e aparentemente disconexas, mas as poucos tudo foi se compondo e interligando e quiçá até tinha sido uma fragmentação intencional a jogar com a temática dos estilhaços de vidro (ou não tem nada a ver mas até parece bem ver por esse prisma).

Entre vários méritos, e sem surpresas grande parte dele vai para os protagonistas, destaco a forma como é feito um filme de super-heróis que não parece sê-lo, dada a relativa plausibilidade da coisa, e a forma como nos vai fazendo questionar tudo e mais alguma coisa ao longo da história, colocando-nos no mesmo estado de espírito e de questionamento dos protagonistas

Não faço ideia se a intenção original do M. Night Shyamalan sempre foi esta, mas é uma verdadeira lição no que diz respeito a como fechar um ciclo e fazer sequelas que valem a pena. Muito curioso para ver o que faz a seguir, e se ganha balanço de vez ou volta a outra travessia do deserto.

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Big Eyes

Um filme diferente de Tim Burton, por diversos motivos. Não há repetição dos seus actores e actrizes fetiche, não há um ambiente gótico e de cores sombrias, e até é um argumento baseado numa história real.

Não é, contudo, uma história real qualquer; é uma história boa demais para não ser contada por alguém como Burton.

Durante os anos 50 e 60, uma série de quadros invulgares de crianças com olhos gigantes fez um sucesso estrondoso. Os quadros eram assinados por Walter Keane, mas na realidade quem os pintava era a sua mulher Margaret, prisioneira da voracidade comercial do seu marido e refém da sua própria arte durante muito tempo.

O que acabei de dizer acima parece um grande spoiler, mas está presente no próprio trailer e não diminui em nada a experiência do filme, cujo grande mérito é mostrar toda esta realidade quase como se de um conto se tratasse, indo do sonho cor-de-rosa com que Walter envolve Margaret de início, à beira da loucura em que ambos mergulham à medida que a mentira se adensa.

Longe de ser brilhante, é impecável e eu gostei bastante. Até da musiquinha da chata da Lana del Rey eu gostei.

Bateu uma vontade imensa de ver um filme dele sobre os quadros do Menino da Lágrima!

 

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12 Years a Slave

Um dos filmes de que se fala e com toda a razão, que brutalidade. Ainda é só o primeiro filme que vejo em 2014, mas duvido que saia do meu top pessoal dos vistos no ano.

O maior mérito do filme e do realizador Steve McQueen é a forma crua com que apresenta uma história (real) que tinha todos os ingredientes para ser um dramalhão sentimental de primeira. Nada de banda sonora lamechas ou incentivos fáceis à lágrima, a história em bruto como ela é, acompanhada por um trabalho de fotografia sóbrio e belo na sua melancolia ligeira.

Um músico e pai de família nova-iorquino é iludido por dois pretensos artistas para tocar numa companhia circense, que não mais é que um logro para vendê-lo como escravo em Washington, a que se segue um calvário de, como o título indica, doze anos em cativeiro.

A intensidade do sofrimento do protagonista é ainda mais agonizante por ser tão contida, numa interpretação de génio de Chiewetel Ejiofor. Em contraposto e em semelhante brilhantismo está o temível patrão personificado por Fassbender, que deve ter tido dificuldades para dormir à noite depois de algumas das cenas deste filme.

A ver, rever e a mostrar nas escolas.

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The Raid Redemption

Este filme serve para quebrar um bocado o tom lamechas que tem imperado por aqui, sendo uma brutal demonstração de acção e violência levada a cabo por uns indonésios que nos fazem o imenso favor de demonstrar que ainda há lugar para os bons e velhos filmes de artes marciais.

A premissa é simples: uma força policial especial é chamada a intervir num edifício onde impera a lei de um barão da droga, mas descobre rapidamente (e da pior forma) que está entregue à sua própria sorte, pois a missão é tudo menos oficial e visa apenas servir o seu mandante, que é corrupto até ao tutano.

De andar em andar a acção vai se centrando em Rama, um policial honesto prestes a ser pai, e que vai se valendo dos seus dotes de lutador para garantir a sobrevivência. E que lutador! O maior elogio às cenas de luta é que elas doem, e muito, só de serem vistas. Pelo meio ainda um enredo clássico de dois irmãos do lado errado da lei, e a dita cuja redenção.

Completamente diferente do filme de que falei antes, mas que também me prende pela originalidade num género maltratado. Aguarda-se o remake parvo americano.

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Ted

Tenho andado a falhar nas reviews de filmes, já vi este há quase um mês e nada disse. Mas muito gostei, como há já algum tempo não gostava de uma comédia à americana.

Nesta em particular, a história centra-se à volta da amizade entre um rapaz e o seu urso de peluche, que ganha vida após o puto fazer um pedido. Os dois vão crescendo juntos, e às tantas são dois trintões que se recusam a crescer, sendo o urso o expoente máximo da vadiagem e do politicamente incorrecto, atrapalhando a todo o momento a já problemática vida amorosa e profissional do comparsa.

Primeiro que tudo, não sou fã do Family Guy. Os desenhos enervam-me e noto que muitas vezes as situações são semelhantes a outras que vi nos Simpsons. O humor aqui empregue segue de forma mais ou menos óbvia a mesma linha, mas parece-me mais original, mais certeiro, e estranhamente mais plausível (!).

É preciso coragem para arriscar uma ideia destas dada o panorama das comédias que fazem sucesso atualmente, e só pela originalidade o filme já ganha muitos pontos. Mas o seu forte principal é a forma como rapidamente “desprende” o enredo do urso. Podia ser um gajo qualquer que ali estava, mas é um urso.

Bom devaneio.

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Gainsbourg

Gainsbourg não é mais um biopic sobre a alucinante e atribulada vida de um génio musical. Ou melhor, é, mas não segue a fórmula habitual do género, e esse é o seu grande mérito.

Num tom mais onírico que dramático, vai desfiando parte dos acontecimentos que o celebrizaram tentando ao mesmo tempo dar um vislumbre da sua total loucura de génio, com personagens e divagações imaginárias que o perseguem por toda a vida. O filme acaba por se perder um bocado nestas viagens pela maionese, mas tudo o que é momento musical compensa e bem, tanto pelas músicas em si, quanto pelas memoráveis encenações que as compõem.

No que a representação diz respeito, aqui não se foge (e bem) à regra e o actor principal transforma-se e é o homem, naquele momento, num grande trabalho de Eric Elmosnino na pele do feio homem que conquistou Brigitte Bardot ou Jane Birkin.

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Lemmy

Uma das grandes vantagens deste documentário é não ser uma homenagem póstuma. Foi filmado com a lenda ainda viva, e são basicamente cerca de duas horas a ser a sua sombra, a seguir os seus passos e a absorver a aura de misticismo que o envolve.

A primeira meia-hora do filme chega a ser algo entediante, consistindo basicamente na recolha de depoimentos de diversos rockers da nova e velha guarda que vão declamando o quanto o veneram, o quanto foram influenciados e o modo como davam o cú e oito tostões para ser como ele. A seguir de lambidelas várias, a coisa melhora bastante.

Enquadramento histórico do seu percurso desde os Rockin’Vickers em Inglaterra até aos Motorhead, diversas histórias de palco e de backstage, desmistificação de outras tantas (corrige que não comeu mais de duas mil mulheres, foram só mil) e testemunho dos seus hábitos de vida demolidores, que levam a crer que com 66 anos já deve alguns à cova.

O badass que ao ser expulso dos Hawkind comeu as mulheres de três dos colegas de banda, que colecciona memorabilia de guerra e que quando o filho único fez 17 anos proibiu-o de consumir cocaína (aconselhou-o a tomar speed, que era bem melhor), é ao mesmo tempo um gajo simples e cativante, um purista que vive verdadeiramente para o que faz, que nunca se furta a um pedido de um fã e que vive no mesmo cortiço desde que veio para Los Angeles, aproveitando o facto de a renda não poder subir mais de 6% ao ano.

Para sintetizar, nada melhor que esta citação do Dave Grohl:

Fuck Keith Richards, fuck all those dudes who survived the sixties. Flying around in private jets, living up their gunslinger reputation as they fuck supermodels in the most expensive hotel in Paris. It’s like: you know what Lemmy is doing? Lemmy is… probably drinking Jack’N’Cokes and writing another record!

Fica para ver, admirar… e headbangar.

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Estômago

Estômago, Uma História Nada Infantil Sobre Poder, Sexo e Gastronomia. Das melhores surpresas cinematográficas que tive nos últimos tempos.

Nonato é um emigrante nordestino que chega à cidade com uma mão à frente e outra atrás, e que descobre num boteco de esquina que tem um talento inato para a culinária. O dono de um requintado restaurante italiano do bairro oferece-se como seu mentor, mas o seu amor por uma prostituta e algumas peripécias pelo meio levam-no à prisão, onde mete os seus dotes de aprendiz de chef a serviço da sua sobrevivência.

Humor negro, de timing exacto e alguns twists muito bons, bem acompanhados por cinematografia, banda sonora e actores a serviço de personagens que se movem num ambiente de uma inocência que no fundo não existe em nenhum deles.

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The Fighter

Este fim-de-semana tínhamos bilhetes para ir ver a peça Azul Longe das Colinas, mas uma das actrizes aleijou-se, a coisa foi cancelada e deram-nos bilhetes para dia 19 de Março. Restou-nos fazer duas cinemadas em vez de uma.

A primeira foi esta, em cuja pré-produção de certeza que o Mark Wahlberg andou a emborcar batidos da carne que se esvaiu do carocho do Christian Bale. E que carocho do caraças, mas já lá vamos. Começo por dizer que gostei mais do filme do que à partida esperava. Sem demasiadas pretensões, tem tudo no sítio: bem escrito, bem realizado e bastante bem interpretado por todos, até pelos personagens mais insignificantes, como as chulas das irmãs que os lutadores levam a reboque, conseguindo tirar o melhor partido possível de um género de história relativamente batido.

É como se estivéssemos a assistir a dois documentários em paralelo, um a acompanhar a decadência de Dicky Ecklund, que em tempos derrotou Sugar Ray Leonard e era conhecido como “The Pride of Lowell” mas agora vive entregue ao crack, e o irmão mais novo, Micky Ward, que por mais que lute não consegue sair da cepa torta graças às trapalhadas da família. Às tantas a paciência chega ao limite, motivado por uma nova namorada que não papa grupos (Amy Addams também em grande plano) e pela perspectiva de ser um falhado por toda a vida.

Não sei até que ponto Bale deveria ser considerado actor principal do filme, porque é ele o fio condutor da história e quem efectivamente rouba a cena, com a entrega do costume. Deliciosas as cenas em que canta “I started a joke” dos Bee Gees (e mais tarde dos Faith no More), e principalmente “Here I Go again” dos whitesnake, com o mano.

Uma nota também para as cenas dos combates em si, brutalíssimas, utilizando os comentários, cameras e operadores originais dos combates antigos na HBO, recriando o verdadeiro ambiente do desporto.

Não é brilhante, mas entretém bastante. A rima não é intencional, mas fica aí.

This weekend we were supposed to go to the Theater, but one of the actresses of the play got injured and they got us tickets for 19th March. The alternative was catching two movies instead of one.

The first one was The Fighter, in which pre-production Mark Wahlberg surely has eaten huge meat chops of his junky colleague Christian Bale. And what a junky! I enjoyed this movie more than expected. Without being to pretentious, it took the most of a usual and sort of commonplace history; great direction, argument and portrayal from each actor, even the most insignificant ones, like the useless bunch of sisters the brothers share.

Its like watching two documentaries in parallel, the first one about the decadence of Dicky Ecklund, who defeated Sugar Ray Leonard in the past and was know as “The Pride of Lowell” but now is totally devoting to ruining his life with crack, and his little brother, Dicky Ward, who fights really hard but never goes nowhere, because of the constant fuck-ups the family makes. At some moment he reaches the boiling point, motivated by his new “take no shit” girlfriend (also a great job by Amy Addams) and the perspective of being a looser his whole life.

I guess Ecklund should be considered the lead character, since he leads the story and Bale definitely steals the show with his usual commitment. Delicious moments singing “I Started a Joke” from the Bee Gees (and later on from Faith no More) with his mommy and, especially, “Here I Go Again” from Whitesnake with his little brother.

Not brilliant, but very, very entertaining.

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