A minha casa fica por trás do Hotel Praia do Sol, da Rua dos Pescadores. Tenho com este hotel uma relação de amor-ódio, mas tenho que lhes dar a mão à palmatória desta vez: a propósito do seu septuagésimo quinto aniversário (são o hotel mais antigo da Costa), montaram uma exposição louvável, que mostra um pouco do que era a Costa dos anos 30 aos anos 60 do passado século. É raro haver iniciativas deste género nesta cidade, que constantemente esquece ou esconde a enorme tradição que carrega.
A exposição não tem tantas imagens quanto isso, mas as que lá estão, são de qualidade, e muito bem acompanhadas da respectiva contextualização histórica; ficamos a conhecer a origem do problema da falta de planeamento urbanístico do território, e a história de Manuel de Agro Ferreira, o grande dinamizador turístico da actual cidade, que até então nem vila era.
Ver essas imagens levaram-me a pensar na Costa de hoje, agora que finalmente são visíveis os efeitos do programa Polis, que deveria ter terminado em 2006, e vai nesta altura mais ou menos a meio caminho. Quem reclamou das obras ou mesmo dos seus resultados, revela uma tacanhez tremenda: a Costa está incomensuravelmente mudada para melhor.
A Costa finalmente tem a frente de praias que merece, ainda que inacabada. O chamado pontão já não era nada, completamente esburacado e esbaforido, dando até mesmo ar de pós-guerra, a partir do Primoroso; os restaurantes e bares não eram mais que barracões velhos de mau aspecto, por mais personalidade que lhes restasse; piores ainda eram os antigos contentores carunchosos dos pescadores, uma nojice tremenda, que em nada dignificava a honrosa profissão dos homens.
O paredão está inteiramente renovado, e com bastante mais espaço, organização e iluminação; os restaurantes e bares, ainda que à primeira vista aparentassem uma padronização um tanto quanto sem graça, estão agradáveis e bem aproveitados. Ao longo de todo o caminho, bastantes bancos e alguns chafarizes (que não funcionam muito bem, mas dão para o gasto).
Foram colocadas escadas de acesso às praias bastante largas, com um ar de segurança contrário às de pedra, que todos os anos eram destruídas; as praias em si levaram mais uma vez com preenchimento de areia, que não tenho a certeza que dure, mas que lhes confere um óptimo aspecto, travou o avanço do mar e desafogou a sobrelotação este ano. Os apoios de praia dos pescadores são um autêntico luxo, comparado com os antigos contentores.Vai sendo feita uma ciclovia, que de momento ainda só vai do Tarquínio ao Cuíca, mas que promete acompanhar todo o paredão.
A Avenida General Humberto Delgado foi reorganizada, aberta aos dois sentidos em toda a sua extensão (era apenas para transportes públicos a partir da Feira dos Ciganos), e reservada em grande parte para maior trânsito pedonal. A rotunda que foi feita por trás do Barbas aparenta não ter sido muito pensada (não conseguem entrar e sair da rotunda ao mesmo tempo dois autocarros em sentidos opostos), mas o trânsito de verão melhorou, ainda assim.
O velhinho Parque de Santo António deu lugar a um Parque Urbano com três Parques Infantis enormes, dois campos de ténis e bastante espaço verde ao redor, ainda que à custa do abatimento de muitas árvores antigas. Outras já começam a nascer em seu lugar.
A Feira dos Ciganos também desapareceu. Por mais que me desse jeito para comprar meias e boxers, o amontoado de lixo e de confusão que dali saía diariamente não deixa saudades nenhumas. Não percebo bem o intento da espécie de rotunda a que deu lugar, que vai sendo aproveitada como estacionamento; fico à espera que ainda me surpreenda.
Como nem tudo é um mar de rosas, alguns pontos negativos:
- Agora já não é só um Barbas a assombrar, são três: Barbas Catedral, Barbas Tertúlia e Barbas Clube de Praia! Louvo-lhe, no entanto, a “visão de jogo”, e os espaços até estão com bom gosto.
- Parece-me que nunca mais verei o senhor que todos os verões montava uma barraquinha de bandas desenhadas ao pé do Paraíso, personagem extremamente marcante da minha infância.
- O mítico comboio da praia, que liga a Costa à Fonte da Telha, não deixou de existir mas foi deslocado para longe do centro, com partida na Nova Praia, que não tem ligação directa com nada senão os parques de campismo (que também vão desaparecer); não me faz grande sentido, mas parece que a ideia é deslocar futuramente o centro da Costa pr’aquelas bandas.
- Deixou de haver a tradicional pesca de arte xávega nas praias centrais; nesse ponto, ao que consta, os pescadores ainda estão a lutar.
De resto, só tenho a desejar que o ritmo se mantenha, dado que ainda há muita coisa a melhorar.